Transcrevi as belíssimas dicas contidas no texto abaixo extraído do blog http://didaticaaplicada.blogspot.com.br/, que por sinal, é muito bom, uma excelente fonte para professores.
Prof. Leandro Karnal(*)
A sabedoria do mais influente legislador do Ocidente, Moisés, sintetizou
uma concepção de mundo em Dez Mandamentos. Como bom educador, o
ex-príncipe do Egito sabia que longos códigos são de difícil acesso.
Curioso notar que constituições muito breves, como a norte-americana,
passam dos dois séculos e constituições prolixas, como todas as
brasileiras , caducam em prazos muito curtos.
Inspirados neste exemplo, elaboramos os Dez Mandamentos do Professor.
Estes dez mandamentos são fruto de uma experiência particular e não se
pretendem eternos ou válidos em qualquer ocasião. Gostaria apenas de
fornecer a colegas, como você leitor, uma reflexão particular, que possa
ser aprofundada, reinterpretada ou rejeitada de acordo com a sua
experiência.
O que me levou a pensar nestes princípios é a mesma angústia que assola
qualquer educador: como ser um bom profissional, ensinar, transformar
meu aluno e fazer parte desta transformação? Como superar o tédio dos
meus alunos, a indisciplina, a irrelevância de algumas coisas que faço e
meu próprio cansaço? Como não considerar a sala um fardo e o relógio um
inimigo? Como parar de achar que só vivo a partir do fim-de-semana? A
partir destes questionamentos, você está permanentemente convidado a
adensar ou criticar, fazer seus outros dez ou sintetizar a dois ou três,
pois, quem acha que pode melhorar a aula que dá , já começou a viver
educação. E quem não acha que pode? Bem, deixa para lá! Ensinar não é a
única profissão do mundo…
-PRIMEIRO MANDAMENTO: CORTAR O PROGRAMA!
Quase todas as disciplinas foram perdendo aulas ao longo das décadas
anteriores. Não obstante, os programas nem sempre acompanharam estes
cortes. Pergunte-se: isto é realmente importante? Este conteúdo é
essencial? Não seria melhor aprofundar mais tais tópicos e menos outros?
Se a justificativa é a pressão do vestibular, ela não pode ocupar 11
anos de Ensino Médio e Fundamental. Se a justificativa é uma regra da
escola ou um coordenador obsessivo, lembre-se: o Diário de Classe sempre
foi o documento por excelência do estelionato. A coragem da grande
tesoura é essencial. Dar tudo equivale a dar nada. Ensinar a pensar não
implica esgotar o conhecimento humano.
-SEGUNDO MANDAMENTO: SEMPRE PARTIR DO ALUNO!
Chega de lamentar o aluno que não temos! Chega de lamentar que eles não
lêem, a partir de uma nebulosa memória do aluno perfeito que teríamos
sido (nebulosa e duvidosa). Este é o meu aluno real. Se, para ele, Paulo
Coelho é superior a Machado de Assis e baile Funk é superior a Mozart,
eu preciso saber desta realidade para transformá-la. Se ele é analfabeto
devo começar a alfabetizá-lo. Se ele está no Ensino Médio e ainda não
domina soma de frações de denominadores diferentes devo estar atento:
esta é minha realidade. A partir do zero eu posso sonhar com o cinco ou
seis. A partir do imaginário da perfeição é difícil produzir algo. A
Utopia, desde Platão e Thomas Morus, tem a finalidade de transformar o
real, nunca de impossibilitá-lo.
-TERCEIRO MANDAMENTO: PERDER O FETICHE DO TEXTO!
Em todas as áreas, em especial nas humanas, os alunos são instigados
quase que exclusivamente ao texto. Num mundo imerso na imagem e dominado
por sons e cores, tornamos o texto central na sala de aula. Devemos
estar atentos ao uso de imagens, música, sensorialidades variadas. O
texto é muito importante, nunca deve ser abandonado. Porém, se o
objetivo é fazer pensar, o texto é apenas um instrumento deste objetivo
maior. Há pessoas que pensam e nunca leram Camões e há quem saiba Os
Lusíadas de cor e não pense…Lembre-se de que há outros instrumentos. A
sedução das imagens deve ser uma alavanca a nosso favor, nunca contra.
Usar filmes, propagandas, caricaturas, desenhos, mapas: tudo pode servir
ao único grande objetivo da escola: ajudar a ler o mundo, não apenas a
ler letras.
-QUARTO MANDAMENTO: POSSIBILITAR O CAOS CRIATIVO.
Fomos educados a um ideal de ordem com carteiras emparelhadas e, mesmo
no fundo do nosso inconsciente, este ideal persiste. Qual professor já
não teve o pesadelo de perder o controle total de uma sala,
especialmente na noite mal dormida que antecede o primeiro dia de aula?
Devemos estar preparados para o caos criador e para o lúdico. Alunos
andando pela sala, trocando fragmentos de textos ou imagens dados pelo
professor, discussões, encenações, o professor recitando uma poesia ou
mandando realizar um desenho: tudo pode ser canal deste lúdico que
detona o caos criativo. Surpreenda seus alunos com uma encenação, com um
silêncio, com um grito, com uma máscara. Uma sala pode estar em ordem e
ninguém aprendendo e pode estar com muitas vozes e criando ambiente de
aprendizado. Lembre-se o silêncio absoluto é mais importante para nós do
que para os alunos. É difícil vencer a resistência dos colegas e da
própria escola a isto. Lógico que o silêncio também deve ser um espaço
de reflexão, mas é possível pensar que há valor num solo gentil de
flauta, numa pausa ou num toque retumbante de 200 instrumentos.
-QUINTO MANDAMENTO: INTERDISCIPLINAR!
Assim mesmo, entendido o princípio como um verbo, como uma ação
deliberada. É fundamental fazer trabalhos com todas as áreas. Elaborar
temas transversais como o MEC pede e, ao mesmo tempo, libertar o aluno
da idéia didática das gavetas de conhecimento. Não apenas áreas afins
(como História e Geografia) mas também Literatura e Educação Física,
Matemática e Artes, Química e Filosofia. É preciso restaurar o sentido
original de conhecimento, que nasceu único e foi sendo fragmentado até
perder a noção de todo. O profissional do futuro é muito mais holístico
do que nós temos sido até hoje.
-SEXTO MANDAMENTO: PROBLEMATIZAR O CONHECIMENTO.
Oferecer ao aluno o cerne da ciência e da arte: o problema. Não o
problema artificial clássico na área de exatas, mas os problemas que
geraram a inquietude que produziu este mesmo conhecimento A chama que
vivou os cientistas e artistas é transmitida como um monumento inerte e
petrificado. Mostrem as incoerências, as dúvidas, as questões
estruturais de cada matéria. Mostrem textos opostos, visões distintas,
críticas de um autor ao outro. Nunca fazer um trabalho como: “O
Feudalismo” ou “O Relevo do Amapá”; mas problemas para serem resolvidos.
Todo animal (e, por extensão, o aluno) é curioso. Porém, é difícil ser
curioso com o que está pronto. Sejamos francos: se é tedioso ler um
trabalho destes, qual terá sido o tédio em fazê-lo?
-SÉTIMO MANDAMENTO: VARIAR AVALIAÇÕES.
Provas escritas são válidas, como a vitamina A é válida para o corpo
humano. Porém, avaliações variadas ampliam a chance de explorar outros
tipos de inteligência na sala. As outras avaliações não devem ser vistas
como um trabalhinho para dar nota e ajudar na prova, mas como um
processo orgânico de diminuir um pouco a eterna subjetividade da
avaliação.
-OITAVO MANDAMENTO: USAR O MUNDO NA SALA DE AULA!
O mundo está permeado pela televisão, pela Internet, pelos jornais,
pelas revistas, pelas músicas de sucesso. A escola e a sala de aula
precisam dialogar com este mundo. Os alunos em geral não gostam do
espaço da sala porque ele tem muito de artificial, de deslocado, de fora
do seu interesse. Usar o mundo da comunicação contemporânea não
significa repetir o mundo da comunicação contemporânea; mas estabelecer
um gancho com a percepção do meu aluno.
-NONO MANDAMENTO: ANALISAR-SE PESSOALMENTE!
A primeira pessoa que deve responder aos questionamentos da educação é o
professor. Somos nós que devemos saber qual o motivo de dar tal coisa,
qual a relevância, qual a utilidade de tal leitura. O professor é o
primeiro que deve saber como tal ciência transformou a sua vida. Isto
implica fazer toda espécie de questão, mesmo as incômodas. Se eu não
fico lendo tal autor por prazer e nem o levo aos meus passeios como
posso exigir que um jovem ou uma criança o façam? Qual a coerência do
meu trabalho? Minha irritação com a turma indisciplinada é uma espécie
de raiva por saber que eles estão certos? Minha formação permanente me
indica novos caminhos? Estou repetindo fórmulas que deram certo quando
eu era aluno há 20 ou mais anos? É necessário um exercício
analítico-crítico muito denso para que eu enfrente o mais duro olhar do
planeta: o do meu aluno.
-DÉCIMO MANDAMENTO: SER PACIENTE!
Hoje eu acho que ser paciente é a maior virtude do professor. Não a
clássica paciência de não esganar um adolescente numa última aula de
sexta-feira, mas a paciência de saber que, como dizia Rubem Alves,
plantamos carvalhos e não eucaliptos.